Foi a meio de uma troca de argumentos que o activista conservador norte-americano Charlie Kirk, expoente do movimento MAGA nas redes sociais e nos campus universitários, foi assassinado a tiro, a meio de um debate numa universidade do estado do Utah. Tinha 31 anos, milhões de seguidores e um genuíno gosto pela retórica como forma de alterar percepções alheias.
No vídeo partilhado pela CNN, que mostra o momento da morte de Charlie Kirk, mais uma vez rodeado por uma multidão de apoiantes e de detractores, ouve-se um elemento da plateia a questionar a sua tese de que existe uma correlação entre a mudança de género e a propensão para matar.
“Sabes quantos transexuais americanos fizeram tiroteios em massa [conceito que envolve quatro ou mais vítimas mortais] nos últimos dez anos?”, inquiriu o interlocutor, ouvindo “demasiados” como resposta do homem que dedicou boa parte do ano passado a percorrer os Estados Unidos para convencer jovens a votarem num multimilionário septuagenário chamado Donald Trump.
Ainda teve tempo para ouvir o seu adversário daquele instante, sem imaginar que seria o último da coleção de “liberais” que vão servindo de actores e actrizes secundários dos seus vídeos, informar que foram apenas cinco e perguntar-lhe se sabia quantos americanos tinham realizado tiroteios em massa na última década.
“Contando ou não com violência de gangues?”, perguntou Kirk, adivinhando-se a expressão que terá feito, de microfone na mão, ao procurar reduzir o universo dos tiroteios em massa, para que cinco não parecessem tão estatisticamente insignificantes.
Foram as suas últimas palavras. No vídeo da CNN, a mesma que o atacava tanto quanto os canais conservadores o defendiam, ouve-se o barulho do disparo que lhe acertou no pescoço, com outras imagens a mostrarem o crime de forma bem mais gráfica. Horas depois de Donald Trump apelar a que rezassem por um dos apoiantes mais empenhados na sua vitória sobre Kamala Harris, seria o próprio presidente norte-americano a anunciar a morte que já parecia inevitável.
Estrela das redes sociais, Charlie Kirk tinha a coragem de entrar em campus universitários teoricamente bem mais hostis do que aquele em que houve quem disparasse primeiro e fizesse as perguntas nunca. Pelo contrário, nos seus vídeos, onde recusava o pagamento de reparações aos negros norte-americanos ou zurzia a ideia de que os transexuais podiam competir em desportos femininos, mas também defendia o direito à posse de armas consagrado na Segunda Emenda da Constituição dos Estados Unidos, tinha a prática de indicar aos seus apoiantes para deixarem falar quem o punha em causa, silenciando vaias e apupos.
Certamente por querer que os interlocutores se afogassem no seu próprio wokismo e na pura e simples impreparação, mas também pelo gosto de refutar as ideias contrárias com argumentos, mesmo que não raras vezes enviesados e questionáveis. Dele se pode dizer que nunca puxou de uma pistola para calar ninguém, ao contrário do que lhe sucedeu naquela terra da liberdade onde universitários judeus podem ser perseguidos e agredidos por colegas partidários assumidos de organizações terroristas.
Algo está profundamente errado na incapacidade profunda, com ou sem o gatilho nas mãos, de aceitar que ideias contrárias sejam sequer pronunciadas. E pior ficou após o assassinato de alguém que gostava de convencer os outros com as suas palavras. E que morreu, aos 31 anos, deixando viuva e dois órfãos, muito menos devido à Segunda Emenda do que à miséria de haver gente que não tem nenhuma emenda
(Roubado ao Leonardo Ralha)