sexta-feira, 31 de maio de 2024

As escutas de Bugalho (I)

 

Entre as escutas telefónicas da PJ no âmbito do processo de investigação da troca de favores políticos envolvendo deputados, autarcas do PSD e o então presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, foi gravado um telefonema entre Carlos Reis (deputado do Partido Social-Democrata e visado no mesmo processo) e Sebastião Bugalho no qual o empresário pediu o NIB ao comentador porque tinha "uma loja para despachar". Bugalho responde por sms: "O que me pediste, primo". Numa escuta posterior, Carlos Reis pergunta a Bugalho, num sms: "Confirmaste recepção da massa?" Bugalho responde: "Sim, confirmado." A troca de sms termina com uma frase de Carlos Reis: "Ótimo! Recibos antigos amigos, n esqueças pf" - sem entrar em mais pormenores.

A 3 de janeiro de 2018 a PJ pediu a quebra do sigilo bancário da conta de Bugalho colocando a hipótese de "Carlos utilizar a conta do primo para esconder movimentos bancários".

Depois da situação ter sido tornada pública, Sebastião Bugalho garantiu à Sábado que não é primo de Carlos Reis e justificou o envio do dinheiro: "No final de 2017, Carlos Eduardo Reis viajou do Norte para Lisboa, onde nos encontrámos. Conversámos como habitual sobre política (era o meu trabalho). Quando nos despedimos, já tarde, deu pela falta da sua carteira, que havia esquecido em casa, no Norte. Perante isto, fui à caixa de Multibanco mais próxima e emprestei a quantia necessária para o seu regresso a casa (gasolina, portagens, etc.). Pareceu-me, à data, o gesto mais correto e decente. Dias mais tarde, o mesmo procedeu à devolução da exacta quantia por transferência e confirmou-o por SMS. Julgo que nem um nem outro tínhamos algo a esconder, sendo que ambos os movimentos podem ser confirmados pelo meu extracto bancário, cujo historial requisitei assim que fui contactado pela revista Sábado".

A 3 de janeiro de 2018 a PJ pediu mesmo a quebra do sigilo bancário da conta de Bugalho colocando a hipótese de "Carlos utilizar a conta do primo para esconder movimentos bancários".

PAULO REIS

Uma casa portuguesa, com certeza...

Tal como muitas crianças que cresceram à sombra do Estado Novo, as aulas de catequese eram uma obrigação. Tínhamos livros especiais, onde se explicava como funcionava a trilogia Deus, Pátria e Autoridade. Costumava folhear avançadamente esses livros, com a curiosidade própria da minha idade. Mas houve duas imagens que abalaram as minhas convicções e a minha crença na infalibilidade da trilogia estatal. Numa dessas imagens, via-se um navio meio-adornado, quase a afundar-se, com uma legenda: “A soberba é sempre castigada”. O nome do navio era visível, junto à proa: “Titanic”. Durante alguns anos, interroguei-me sobre qual seria a ligação entre um pecado mortal e um navio a ir ao fundo. Andei na Mocidade Portuguesa, a partir da 3ª classe. Tínhamos um uniforme parecido com o da Juventude Hitleriana: camisa verde e calções castanhos, ligados por um cinto com um “S” que logo nos ensinavam ter três significados: “Salazar, Serviço e Sacrifício”. Mas lá por casa havia livros por todo o lado, e muitas espécies de livros, porque o meu pai era um leitor compulsivo. E eu comecei a tentar econtrar, nalguns desses livros, informção que me esclarecesse as minhas dúvidas.

Um dia perguntei ao meu pai o que era o Titanic. Ele explicou-me, pormenorizadamente, que tinha sido uma das grandes tragédias dos tempos modernos, quando um navio que todos diziam ser impossível afundar, colidiu com um icebergue e naufragou, morrendo largas centenas de pessoas. Fiquei calado, a tentar vislumbrar qual o sentido de considerar uma tragédia como sendo uma manifestação de soberba.

Outra imagem que me marcou, nesses livros de catequese, retratava uma típica família portuguesa: a mãe à porta de casa, com um filho nos braços e outro agarrado às saias, com a figura do pai visível a poucos metros, a afastar-se. Ia de enxada ao ombro e descalço – tal como a mãe. Eu teria uns sete ou oito anos e aquela imagem espantou-me. Nascido em Angola, não me lembrava de ter visto, nunca, um branco descalço. Só os negros é que andavam descalços. Foram dois episódios que me marcaram, pelo seu absurdo e pela minha dificuldade em entender aqueles paradoxos – o navio Titanic, a ser considerado um exemplo de luxúria e soberba e a família branca, típica de uma aldeia portuguesa, descalça.

Foram precisos alguns anos para eu conseguir perceber o sentido daquelas duas imagens. Voltei a interrogar o meu pai, já com a certeza de que, nos meus dez, onze anos, ele não me recusaria uma explicação. E foi assim que fiquei a conhecer a tragédia do Titanic, uma tragédia longe dos ensinamentos religiosos que nos impingiam. O mistério da família de pés descalços foi-me esclarecido de forma mais dolorosa. Em Portugal, como me disse o meu pai, havia muitas famílias pobres, que não tinham dinheiro para comprar sapatos. 

E explicou-me que, a primeira vez que ele calçou um par de sapatos, foi para ir fazer o exame da 4ª classe. A professora era uma velha solteirona, dura e seca, que autorizava os alunos a virem descalços para a escola, mesmo quando se realizavam os exames da 1ª à 3ª classes, com uma excepção: no dia do exame da 4ª classe tinham que vir calçados ou não entravam. E foi assim que o meu pai calçou os primeiros sapatos da sua vida – uns sapatos emprestados por um primo de família mais abastada, três dedos maiores que o pé dele, de maneira que teve que atar um fio em cada um, para que os sapatos não lhe caíssem. 

Como era uma data para celebrar, o exame da 4ª classe, onde a maioria dos miúdos da aldeia não chegavam, a minha avó preparou-lhe um almoço especial: para além da habitual batata cozida, enrolada num papel, que era o seu almoço diário, conseguiu arranjar meia sardinha assada, para melhorar a refeição. Saídos os resultados, foi dia de festa, lá em casa. O meu pai tinha sido o melhor classificado da turma e essa classificação traçou-lhe a vida, pelos nos 20 anos seguintes. Por decisão do padre daquela paróquia e da professora, o destino dele foi decidido: como era o mais inteligente, ia para o seminário, para ser padre. E foi. Mas não chegou a ser padre...

Opinião / Paulo Reis  

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Rua do Benformoso: Nem formosa, nem segura


PAULO REIS

Conheci o T. numa noite de copos, no Bairro Alto. Era polícia à paisana, dedicado essencialmente ao combate ao tráfico de droga. Na mesa estava também um colega jornalista, que trabalhava na área do crime. Fiz-lhe algumas perguntas, curioso sobre o tema e trocámos telefones, para outra noite de copos.

Liguei-lhe uma semana antes de ir fazer um passeio pela rua do Bemformoso, para “cheirar” o que lá passava – e que seria interessante, pelas notícias e reportagens que ia lendo e vendo em diversos órgãos de Comunicação Social.

Pedi-lhe um retrato de como é que funcionavam as coisas, por ali. E era simples: indianos e paquistaneses dedicados ao tráfico de mão-de-obra e guineenses a controlar a venda de droga – essencialmente “crack”, o parente pobre da heroína. Barato – uma “pedra”, mais conhecida por “pipoca”, para consumo de uma pessoa, custa apenas 5 euros. Tem um efeito rápido, é extremamente viciante, mas o tempo de "pedrada" é curto.

Numa terça-feira pus-me a caminho. Cheguei pouco antes da hora do almoço e, para fazer “contacto”, logo no princípio da rua do Bemformoso, perguntei a um indiano com aspecto de “junkie”, se conhecia algum bom restaurante.

Embora fosse na direcção oposta à minha, fez questão de inverter caminho e levar-me ao restaurante. No trajecto, perguntou-me o nome e respondeu com o seu nome, também: Dierk, pareceu-me ouvir. Duzentos metros acima do início da rua indicou-me o “Taste of Lahore”. Foi comigo até à porta, obviamente para que o patrão percebesse que ele é que tinha angariado o cliente. Antes de nos despedirmos, pediu-me uma ajuda, perguntando se eu tinha algumas moedas. Vivia em Portugal há dois anos, mas estava sem trabalho, nem tinha dinheiro para pagar uma cama. Dei-lhe cinco euros, o que ele agradeceu efusivamente.

O restaurante de Lahore que não era de Lahore

No restaurante, veio o patrão falar comigo. Quando olhei para o menu, disse-lhe que aquilo eram pratos indianos. Ora, Lahore é uma cidade paquistanesa. Riu-se e não me soube dar qualquer explicação. Percebi que havia uma coisa fora da ementa: cerveja, que era algo que cairia bem no calor insuportável que se fazia sentir. “No beer, sir” - uma frase que ouvi repetida 30 ou 40 vezes, em tantos mini-mercados e restaurantes onde fui, durante dois dias. Depois reparei que, em todos os sítios onde se comia ou se faziam compras, como os mini-mercados, havia sempre a palavra “Halal” - “permitido, autorizado”, coisa que não acontecia com o álcool, “Haram”, proibido, fora da lei islâmica.

Tentei um primeiro contacto e perguntei ao patrão se conhecia algum sítio onde alugassem quartos, acrescentando que era turista e queria conhecer aquela zona. Disse enfaticamente que não conhecia nenhum sítio nem tinha amigos que conhecem.

Sem me dar desanimado, com esta primeira derrota, subi a rua do Bemformoso. O meu objectivo original era arranjar uma cama ou um quarto, numa daquelas casas onde habitavam nove ou dez imigrantes. Duas horas e dezenas de contactos depois, não tinha conseguido nada. Até a barbearias fui, sempre com mesma pergunta – um quarto para alugar – e com uma de duas respostas: alguns não conheciam nada, completamente, outros admitiam que conheciam mas estava cheio. Tudo obviamente falso, mas justificado por uma intrínseca desconfiança, um branco a perguntar por quartos naquela zona que, de turística não tem muito: um ou outro casal estrangeiro, de calções e t-shirt, de meia idade, com um ar perdido e mapa na mão, procurando sítios diferentes.

 

Uma guia contratada


Ia a meio da rua quando fui abordado pela M. Loira magrinha mas com uma cara bonita, o cabelo preso, num nó, no alto da cabeça e uma mini-saia que mais precia um cinto largo e que pouco deixava à imaginação. Soube depois que tinha apenas 24 anos, mas parecia ter mais.

Pediu-me umas moedas, não tinha dinheiro para comer. Dei-lhe dois euros e ela aproveitou para subir a parada: “Arranja-me mais três euros...” Percebi, pela conversa que tinha tido com o meu amigo polícia, que ela estava à procura do dinheiro suficiente para uma dose, cinco euros.

Propus-lhe um negócio: eu dava-lhe os cinco euros, mas ela servia-me de guia, para me mostrar a rua do Benformoso. Aceitou logo e subimos até uma esplanada no largo do Intendente. Perguntou-me se podia convidar uma amiga, para beber uma cerveja. Saiu e voltou, cinco minutos depois com a G. uma morena sorridente e bem-disposta, trinta e quatro anos, três filhos. Trocaram a parafernália necessária, a M. tinha cachimbo, mas não tinha “ferrinhos”. Perante a minha curiosidade, explicaram-me que os “ferrinhos” eram pedaços da vareta de um guarda-chuvas, com um palmo de comprimento. Servia para limpar bem o cachimbo, antes lá meter a pedra. O passo final era encher o resto do cachimbo com cinza de cigarro. “Para filtrar”, explicou-me a G. Lá foram as duas, com a promessa de um regresso breve. Lembrei à M. o nosso acordo, o trabalho de “guia” pela Bemformoso que eu lhe tinha pedido. Jurou que voltava já, depois de fumar.

Fui bebendo a cerveja que tinha encomendado e, quase uma hora depois, nenhuma delas tinha voltado. Paguei a conta e desci rua abaixo, na expectativa de as encontrar. Duzentos metros percorridos, estavam as duas, sentadas no degrau de uma casa obviamente vazia, com um cadeado enorme. Via-se pelos olhos que estavam as ambas “numa boa”, com a “alta” garantida nas próximas horas.

Uma “manobra” perigosa

Convidei-as para almoçar mas só a G é que aceitou. No caminho, encontrámos outra jovem, a S., amiga da G., com um ar de adolescente. A G. perguntou-me se ela podia almoçar connosco e eu aceitei. Encomendámos dois pratos e alguma panquecas indianas. A S. estava muito em baixo, comeu meia panqueca e saiu, com o mesmo tipo de despedida a que já me começava a habituar: “Vou ali, já venho”. A G., mais prática devorou um prato de galinha com caril e duas panquecas enormes. Pegou no resto de um prato de arroz e em parte da carne de vaca que eu não tinha comido, colocou tudo num prato e disse à empregada que era para levar. Explicou-me que tinha de sair, para ir guardar as coisas dela no quarto de uma amiga. Coisas que se resumiam, tal como a vida dela, a dois sacos de supermercado, cheios de roupa e uma mochila.

Foi aí que passei o único momento perigoso, por mera casualidade. Enquanto fui à casa de banho, a G. foi-se embora. Reparei numa mochila, exactamente na mesa onde tínhamos comido e parti do princípio que ela se teria esquecido. Peguei na mochila e saí porta fora. Não tinha andado dez metros e vem a empregada a correr atrás de mim, com dois indianos de má cara, que me tiraram a mochila, com alguma violência. Tentei explicar-lhes que tinha sido um engano meu mas limitaram-se a virar as costas e regressar ao restaurante.

Fiquei ali parado, a fumar um cigarro. Â minha frente, do outro lado da rua, nas escadinhas que desembocavam da rua do Terreirinho na rua do Benformoso, sete ou oito junkies despachavam cachimbos de crack, à luz do dia, ou enchiam-se de sangria, para “amaciar” a ressaca, por não terem conseguido os 5 euros para a "pipoca".

Um deles, um africano musculoso e dois palmos mais alto que eu, veio ter comigo, com o habitual pedido de duas moedas. Abri os cordões à bolsa, novamente, e ele perguntou-me o que é que tinha acontecido com a mochila. Expliquei-lhe a história da confusão e o comentário dele foi bastante explícito: “Meu irmão, tiveste uma sorte do c......o em não teres levado uma carga de porrada. Tens que ter cuidado, estes gajos aqui não perdoam nada e quando vêm para cima de um tipo vêm aos cinquenta, com tudo, paus e pedras. Agradece já a Deus, porque tiveste muita sorte”.

Confissão da minha “missão”

 


Em troca do conselho, dei-lhe as três moedas restantes para comprar uma “pipoca”. Aproveitei uma certa empatia que se tinha criado entre nós e resolvi abrir o jogo. Disse-lhe que era jornalista e estava ali para fazer uma reportagem e explicar à pessoas como era a realidade da vida diária no Benformoso. Perguntei-lhe se podia sentar-me nas escadinhas, ao pé dos restantes junkies. “Não há problema, estás à vontade”. Quando me aproximei, ele fez as honras casa e apresentou-me: “Este é o sr. Paulo, é jornalista e vem aqui fazer uma reportagem”.

A informação deixou o pessoal todo mais relaxado, depois de alguns olhares algo desconfiados, quando me viram a caminhar em direcção às escadinhas.

De dez em dez minutos aparecia alguém para fumar um cachimbo. O L. expansivo e falador, de tronco nú, estava a meio de uma garrafa de sangria. Parecia conhecer toda a gente que por ali passava. “Everybody and his dog”, como dizem os ingleses. E era atrevido, sem mostrar medo. Quando reparou num amigo, do outro lado da rua, obviamente a preparar-se para ir buscar uma “pipoca”, lançou-lhe um berro: “Pá, não vás a esses, vai ao outro gajo de branco” - um africano entroncado de t-shirt branca. Os potenciais vendedores de que ele tinha afastado o amigo nem sequer reagiram.

Desesperadamente à procura de uma cerveja

A G. e a M. tinham desaparecido, deviam estar ainda a curtir a pedrada no mesmo degrau onde as tinha visto. Fiquei por ali, na conversa, durante quase quatro horas. Apetecia-me alguma coisa fresca, mas não vou muito com a sangria. Perguntei ao F. se sabia onde comprar cerveja, por ali. “É já aqui”, respondeu-me. Andámos vinte metros e entrámos num café minúsculo, com um balcão de metal de metro e meio e espaço para apenas duas mesas. Por trás do balcão, uma portuguesa de cabelos brancos, nos seus cinquenta, sessenta anos. Comprei três Sagres e voltámos às escadinhas. Ofereci a terceira cerveja ao africano alto que me tinha aconselhado a ter cuidado e, depois, me deu “autorização” para sentar nas escadinhas.

Foram conversas interessantes, histórias de vidas complicadas, como T., que vivia numa tenda, num parque na zona de Campolide. O trabalho dele era angariar clientes, à porta de um bar, na zona do Bairro Alto. O ordenado, sé que se pode chamar assim, era duas dúzias de euros. Mas, como ele salientou, bebia à pála e ainda tinha algumas gorjetas de clientes satisfeitos. A três metros de nós, junto a dois caixotes de lixo, a C., uma africana gorducha e nos seus quarenta anos, atarefava-se a construir uma “casa”. Nós estávamos sentados junto à parede de um prédio, onde ainda havia alguma sombra. A C. rasgava caixas de cartão e colocava-as, com destreza, em escadinha, encostados aos caixotes de lixo. “Está a construir um 'casulo”, gozou o T. Com alguma habilidade, a C. lá conseguiu um espaço parecido a uma tenda. Deixou uma abertura, no lado virado para nós, meteu a cabeça de fora e avisou: “Agora vou dormir a sesta...” Se cá fora estava um calor insuportável, naquela barraca improvisada a temperatura devia andar pelo quarenta graus.

Entretanto, a M. reapareceu. Lá veio com a pedinchice habitual, duas moedinhas, mas dessa vez era só para uma sangria. O meu porta-moedas esvazia-se a toda a velocidade e já ia no segundo maço de tabaco – fornecendo, obviamente todo o pessoal que me rodeava.

Um alojamento tranquilo

Nessa altura, já tinha desistido da ideia de conseguir alojamento numa casa de imigrantes. As respostas negativas à minha busca por um quarto eram desmentidas pela própria realidade. Junto às escadinhas, mais abaixo, já em plena rua do Benformoso, viam-se três prédios, de cinco andares, com as cordas cheias de roupa – toalhas de banho e calças de homem. Perguntei ao T. quem morava ali. “Uma porrada de gajos, todos indianos. Aquilo está completamente cheio”, respondeu.

 


Pedi à M. para me arranjar um quarto. “Sem problemas” disse ela, com o seu tom de sempre, desenrascada e mexida. Levou-me a um alojamento local, bastante bom, limpo e quase vazio, no princípio da rua. Eram quarenta euros por dia, com casa de banho colectiva, cinquenta euros com casa de banho própria. Optei pela primeira solução. Quando saímos, a M. explicou-me que era uma casa limpa e tranquila, que era muito usada quando as raparigas sacavam alguém para ir para o quarto – prostituição, obviamente.

Regressámos às escadinhas, onde estava a G. com um ar normal – nem passada nem ressacada. Queixou-se de que estava sem roupa e que precisava de ir ao Martim Moniz, fazer compras. Aceitei acompanhá-la sabendo antecipadamente que seria eu o pagante. Entrámos noutro mundo, dominado por chineses. Controlam essencialmente todo o sistema logístico de abastecimento não à suas lojas, como também às lojas de indianos. Estabeleceram-se ali, numa espécie de filial, vindos de um grupo ancorado em Espanha.

A G. procurava uma coisa fresca, que combinasse com os ténis, cor-de-rosa. Acabei por lhe sugerir um top da mesma cor, que ela aprovou. Faltavam-lhe uma “leggings” para combinar, mas correu todas as lojas e não encontrou o que queria. Decidiu ir à loja da Humana, de roupas usadas. Deixei-a ir, com mais cinco euros para as compras. Quando subia em direcção às escadinhas, dou de caras com a M., num abraço ternurento com um rapaz dos seus vinte anos. Quando me viu, veio a correr, no seu passinho sempre acelerado: “Paulo, empresta-me cinco euros para eu comprar roupa para o meu amigo, ele saiu agora do hospital”. Só então reparei na indumentária do rapaz, uma bata de hospital e respectivas calças. Lá foi a M., também para a Humana.

Voltei às escadinhas, já um bocado cansado com o calor e as subidas e descidas da rua do Benformoso. Eram sete e meia da tarde e resolvi jantar, antes de voltar ao quarto. Escolhi um restaurante nepalês, para variar da comida indiana. Pedi uma dose de camarão, com um molho picante e um arroz. Para minha surpresa, ao folhear o menu, reparei que tinham cerveja. Escolhi uma que estava identificada como “Oriental Beer”. O empregado explicou-me que era cerveja nepalesa e eu decidi experimentá-la, pela primeira vez na vida. Fiquei surpreendido com o rótulo: “Gurkha”, o nome uma tribo nepalesa onde, há séculos, o exército britânico recruta soldados para uma unidade de elite.

Depois do jantar, dei um passeio pela rua, de ponta a ponta. Nos passeios, centenas de indianos e paquistaneses, em grupos de três, quatro, estavam entretidos em longas conversas, puxando do telemóvel com frequência. Já durante a tarde tinha visto essa curiosidade mas, à noite, estavam cinco vezes mais pessoas, nos passeios. Pela rua, circulavam outras dezenas de imigrantes, para cima e para baixo, a maioria com mochilas – sinal talvez de que, provavelmente vinham do trabalho para “casa”.

Negócios asiáticos

Tal como o meu amigo polícia me tinha explicado, o trabalho desses grupos teria a ver com sistemas de contratação de mão-de-obra, através de documentos falsos e outras manobras. Só assim se justificava que tanta gente estivesse por ali, nos passeios, às quatro, cinco da tarde, quando é suposto ser uma hora em que se está a trabalhar. Uma das coisas que me provocou curiosidade foi a quantidade de vendedores de rua, parados nos passeios, com duas grades de bebida, vazias e um tabuleiro por cima, cheio de uma mistura que parecia ser especiarias e umas folhas largas. 

 


 

Lá encontrei um vendedor que falava um pouco de inglês e me explicou o que aquilo era: paan sugari. Juntavam uma série de especiarias, tabaco, lima e açúcar, enroladas em folhas de betel. Colocavam tudo na boca, nas gengivas de um lado da boca. As folhas de betel tem um efeito psicotrópico, dão uma sensação de euforia e relaxamento. Os consumidores habituais são reconhecidos pela cor vermelha dos dentes. Os efeitos secundário de um consumo regular são muitos e maus, destacando-se o cancro na boca.

Acabei por arranjar coragem e, uma vez que já ia a caminho do quarto, podia arriscar com alguma segurança. Pedi um “paan sugari” e coloquei a mistela na boca. O sabor não é grande coisa, mas a primeira sensação é uma dormência em toda a boca. Fui rapidamente para o quarto, onde deitei a fora a mistela. Fiquei meio grogue, mas com uma sensação realmente de euforia e bem-estar.

Os ingleses e o eléctrico

Levantei-me cedo, no dia seguinte e fui à procura de um quiosque, no Rossio, para comprar os jornais. Passei pela paragem do célebre eléctrico 28, onde a bicha de turistas se prolongava já, com mais de uma centena de pessoas. Os ingleses são assim, gente feita para existir, como dizia Fernando Pessoa. A gente atira-lhes um eléctrico e saem uma centena a sorrir. No meu caminho para o Rossio, nenhum comissário de bordo velhaco me viu com qualquer sueca – apenas parei, meia-dúzia de vezes, para ajudar outros tantos turistas, perdidos nas intrincadas instruções dos mapas e folhetos.

Mesmo àquela hora matutina, já se viam turistas por todo o lado – provavelmente para aproveitar a temperatura razoável e fugir ao calor do meio-dia. Comprados os jornais, descobri que o velho Pic-Pic se tinha transformado num estabelecimento mais fino, a Fiorela. No meu primeiro ano de vida, em Portugal, regressado de Angola, quase todos os dias passava pelo Pic-Nic, onde se amontoavam largas dezenas de retornados, à procura de amigos e conhecidos. Durante esse ano, vivi à conta de um esquema pouco legal. Tinha dezassete anos quando aconteceu o 25 de Abril. Antes do final de 1974, já tinham começado os confrontos entre movimentos de libertação, transformando Luanda numa mini-Beirute.

As notícias que nos chegavam de Portugal eram más: não havia trabalho, o aeroporto estava cheio de gente a dormir no chão, sem ter para onde ir, das casas de banho saíam rios de urina. Quando a debandada geral começou, resolvi preparar-me para uma vida complicada em Lisboa.

Falei com um dos dealers, que abasteciam a zona onde eu vivia, o "Peniche", com liamba, o haxixe angolano. Na altura, os meus pais tinham uma casa de gelados, quase no centro da cidade. Eu passava algumas horas a trabalhar na caixa e fui aproveitando para desviar, discretamente, algum dinheiro – quarenta, cinquenta escudos por dia. Quando me pareceu ter o suficiente, fiz o negócio e encomendei um quilo ao dealer - três contos, como se dizia então, correspondentes a três mil escudos. Dois dias depois bateu-me à porta com um saco de plástico e a garantia de que estava ali exactamente um quilo. Tinha passado pela mercearia e pediu para pesar o saco na balança. Quando chegou a vez de eu partir, meti o saco na mochila, não fosse a única mala que levava extraviar-se. Sabia perfeitamente que não havia qualquer tipo de controle no aeroporto de Lisboa.

A “paiar” na “pedra”

Ficámos em casa de familiares e, de manhã, quando não estava ninguém em casa eu ia à mochila e fazia dois “talos” - duas doses, enroladas de forma semelhante a um cigarro. Apanhava o autocarro para o Rossio e esperava pelo meu dealer, um amigo sub-contratado. Vvia no Bairro da Coreia, perto da Samba e estava um bocado pendurado, a dormir em casa de amigos, uma dúzia deles dividada por três quartos. Dava-lhe os dois talos e ele ia para a “pedra” - a estátua de D.Pedro IV – para “paiar” (vender, na gíria angolana...) os “talos”. O negócio estava definido como um “acordo de cavalheiros”: eu recebia 120 escudos pelos dois talos e ele tirava a sua percentagem, “ferrando” os talos – retirando alguma liamba de ambos para fazer um terceiro talo, mais pequeno. Recebida a "féria do dia", costumava jantar no Pic-Nic, que tinha uns bifes fantásticos.

Tentei beber o café no restaurante renovado, mas ainda não estava aberto. Sentei-me no Nicola, mergulhado em memórias de quase cinquenta anos. Acabado o café, regressei às escadinhas, onde já estavam os junkies mais madrugadores. A G. passou por ali e pediu-me um favor. Já não tinhas onde guardar as coisas dela, queria guardá-las no meu quarto. Concordei e lá fomos. Enquanto arrumava a roupa, despejou um pequeno saco de cartão em cima da cama, à procura do batom e do rímel. À mistura, caíram mais de dúzia de preservativos, sem que ela piscasse os olhos, sequer. Mas também já não havia segredos entre nós, eu sabia perfeitamente o que ela fazia na vida. Falámos um pouco daquela cena dos imigrantes indianos e paquistaneses parados nos passeios, o dia inteiro, em grupos de três ou quatro - cena um bocado insólita. Mas nalguns casos, eram negociantes astutos. Nas lojas de telemóveis, por exemplo, podia carregar-se a bateria de um telefone por cinquenta cêntimos – um exemplo da rapidez com que os asiáticos aprendem a fazer negócios, ao contrário daquilo que o Marcelo Rebelo de Sousa disse de António Costa. A G. mostrava-se algo furiosa com toda aquela situação: “Estes tipos não fazem nada, estão ali na conversa todo o dia, mas têm dinheiro para f.....!” Dei instruções à senhora da portaria – uma cabo-verdiana a quem todos chamavam tia – para deixar a G. entrar no meu quarto, quando quisesse.

De regresso aos impérios

Quinze minutos depois, estava perto das escadinhas, onde a conversa andava por todas coisas do mundo, pela vida complicada, pela dificuldade em arranjar os cinco euros para uma “pipoca”.

F. queixava-se sobretudo do desprezo com que as pessoas olhavam para eles. “Julgam que andamos nesta vida porque queremos? Nós caímos, mas eles também podem cair, um dia...” argumentava.

Às tantas, falou-se nas festas da cidade. Já se viam algumas ruas decoradas e era uma altura de bom tempo para o pessoal porque era mais fácil arranjar umas gorjetas. “Dia 10 Junho não é só o 10 de Junho” disse subitamente O., um dos mais calados do grupo. “É dia de Portugal e de Camões”! berrou, batendo com a mão no peito. A afirmação suscitou algumas dúvidas, com vários deles a perguntarem quem era Camões. O mesmo O. explicou-lhes: “Há três poemas que são os melhores que a Humanidade produziu. A 'Eneida' que é grega e tem um herói, Eneias, a Odisseia, que também tem heróis, Ulisses e Aquiles, e os Lusíadas”. Levantou a voz e disse: “Os dois primeiros têm heróis, só os Lusíadas é que não têm um herói, os heróis dos Lusíadas somos todos nós, o povo português”.

Embalámos numa conversa interessante e inesperada. Quando mencionei Fernando Pessoa, como “adversário” de Camões, O. rejeitou liminarmente. “Fernando Pessoa não existiu nunca, foi apenas um heterónimo de Alberto Caeiro. Esse sim, é que foi o nosso segundo grande poeta”.

Já em matéria de dramaturgos, concordámos em Gil Vicente, como o nosso mais importante. A nível internacional, também houve acordo: William Shakespeare, sobretudo “Hamlet”. Durante as três horas seguintes, falámos um pouco de tudo, desde o império Mongol até às influências da música celta nas gaitas de foles do Norte de Portugal.

Estivemos entretidos até às sete da noite, com uma pequena interrupção: dois carros da polícia, vindos da rua do Terreirinho pararam junto às escadinhas, por volta das seis horas. Três polícias saíram e, de forma brusca, deram ordem para sairmos dali: “Vá, toca a andar, pessoal, desapareçam daqui.” Virámos a esquina, descemos vinte metros e ficámos de olho nos dois carros da “bófia” que continuaram pela rua do Bemformoso acima. Cinco minutos depois, estávamos novamente nas escadinhas. Por volta das sete e meia, anunciei ao pessoal que ia jantar. F. disse que não valia a pena, que íamos jantar juntos e que eu era convidado deles. Perguntei onde íamos jantar e ela respondeu: "Na praceta". Fiquei algo surpreendido, por saber que não havia restaurantes na praceta do Martim Moniz. “Confia em nós”, insistiu o F. “Vamos às oito horas.” E lá fomos andando, Benformoso abaixo, em direcção ao Martim Moniz, até chegarmos junto de uma carrinha da Igreja Sana, uma instituição de caridade que fornecia alimentos aos necessitados. Coloquei-me na bicha, com alguma vergonha interior, sabendo que ia “roubar” uma refeição a alguém que, se calhar, precisava mais dela do que eu.

Uma sobremesa especial

Sentámo-nos num degrau do jardim e saboreámos uma boa sopa portuguesa, reforçada com um pão, uma garrafa de água e uma maçã. Terminado o “repasto”, F. deu a “voz de comando”: “E agora vamos à sobremesa...” Riu-se com a estupefacção que se via na minha cara e explicou: “Vamos a uma pipoca...” Voltámos às escadinhas, com o número de imigrantes nos passeios já reduzido e grande parte das lojas com os taipais corridos. Por volta das onze da noite decidi ir para o quarto. Despedi-me do pessoal, que ainda ficou por ali. Já passava da meia-noite quando me deu a fome. A sopa da caridade estava muito boa, de facto, mas era pouco. Saí do quarto e percorri parte da rua sem vislumbrar loja aberta. De repente, vejo um dos meus amigos das escadinhas, o Z, a descer a rua. Ficou preocupado comigo e perguntou se tinha algum problema. Expliquei-lhe que tinha fome e estava tudo fechado.

 


“Não há problema, é já aqui”. Virámos à esquerda, no fim da rua do Benformoso e andámos dez metros. Um indiano, encostado aos taipais de ferro de uma loja, fumava tranquilamente um cigarro. Z. cumprimentou-o efusivamente e o indiano puxou a porta de ferro para cima. Era um esquema perfeito para fugir a qualquer infracção: a loja estava fechada, tudo bem. Abria sempre que aparecia algum cliente. Comprei alguns iogurtes e pacotes de snack. Despedi-me do Z., mas prometi-lhe que um dia havia de voltar para beber uma cerveja com o pessoal das escadinhas.

Quando entro no quarto reparei que as coisas da G. ainda lá estavam. Preparei-me para uma noite de sono curta, prevendo logo que ela só viria às tantas da manhã. Eram cinco e meia quando me bateu à porta. Estava estoirada e cheia de frio. Perguntei-lhe como é que tinha corrido a noite e ela desabafou: “Foi uma m...., não consegui sacar ninguém”. Deitou-se e dois minutos depois estava a dormir. Levantei-me às nove da manhã e tive que sacudi-la durante cinco minutos para ela abrir os olhos. Despedi-me e ela retorquiu: “Arranja-me umas moedinhas” - tarefa impossível, para mim, naquela altura, com o porta-moedas já vazio.

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 As escadinhas, vazias por causa da torreira do sol. Perto dos caixotes do lixo, o barraco improvisado da C.

Três prédios seguidos, com a cordas cheias de roupa, toalhas de banho e calças de homem. "Casa" para largas dezenas de migrantes.

 Uma banca de "paan sugari" um entorpecente feito à base de folhas de betel, especiarias e tabaco. A "pedrada" é suave e deixa-nos num estado de euforia e relaxamento
  

O ex-Presidente da Câmara, Fernando Medina, ainda hoje é "recordado" por alguns habitantes daquela rua

Na bicha para a "sopa dos pobres"



Centenas de pessoas, indianos e paquistaneses, ocupam os passeios das ruas, desde o fim da manhã até ao anoitecer 

O jantar, pouco mas saboroso - sobretudo a sopa com vegetais 

PAULO REIS
 
PS: O Correio da Manhã noticia hoje que uma das raparigas que eu conheci, ontem, nas escadinhas da rua do Benformoso, morreu. Houve uma discussão entre ela e outro junkie, por causa de uma dívida. O junkie empurrou-a, ela caiu, bateu com a cabeça no chão e morreu (Editado às 12h35, dia 1 de Junho de 2024)



 

terça-feira, 28 de maio de 2024

Pope Francis, the fox and the chickens

 

AS TIME GOES BY (CHRONICLE) - PAULO REIS

The comments of Pope Francis, in a private meeting with Italian bishops, about gays have been the target of many comments. People, in general, was surprised, as Pope Francis has been giving steps considered to be "revolutionary" in a still very conservative church. The Pope already talked about blessing same-sex couples in some circumstances and has frequently talked of gay people being welcome in the Church.

Some of those steps were even contested by part of church, with bishops and priests from several African countries announcing that they will not follow the "advice" of Pope Francis about blessing homosexuals.

To put some fuel in the fire, several non-identified sources mentioned that the Pope used a specific word - "frociaggine" - something that can be translated as "bichas" in Portuguese - a extremely derogatory word.

But this step forward was followed by another one, on the opposite direction. When asked if gay men should be allowed to train for the priesthood as long as they remained celibate, Pope Francis told the bishops a blunt "no". The explanation of Pope Francis for this decision was something surprising. Not allowing gay men to train for the priesthood was justified by the fact that in the church there was already “too much of an air of frociaggine”.

Most people considers this statement as a kind of confession. The existence of a reasonable number of not only homosexuals but also child abusers in churches all over the world has been a scandal in the last decades and became the target of investigations and criminal accusations.

I understand the difficult position of Pope Francis. I have a personal knowledge of what used to be - and still is - happening in the dark alleys of seminars and churches. My late father spend around 18 years as a student in a seminary. He quit when he was in his twenty's and volunteered for the army. Many years ago, when I was a teenager, we used to talk about his life in the seminary. 

On one side, the church gave him a education that prepared him for succeeding in the outside world. On other side, he witnessed what were the darkest aspects of the church - a perspective that had a lot of influence in his decision to left the path of priesthood. He was lucky, because he never was the target of one of those abusers that preyed in young boys.

The words of Pope Francis show that he knows the reality of what still goes on, in many houses of God. His harsh words may reflect the frustration of somebody that, having a difficult task, feels unable to finish it.

And I agree the clear "no" of the Pope, when asked if homosexuals should be allowed to train for priesthood, as long as they remained celibate. This idea seems to me like giving a fox the job of protecting a hen house.

 

segunda-feira, 27 de maio de 2024

Portugal no top-10 da tabela de gays e lésbicas

 

O PASSAR DO TEMPO (OPINIÃO) - PAULO REIS

Ora aqui está um "campeonato" internacional em que a nossa seleção (?) esteve à altura das suas capacidades: "Portugal volta ao top-10 da tabela de gays e lésbicas", noticiou o Correio da Manhã. Nesta "competição", lideram o ranking Malta, Islândia e Bélgica, num total de 49 países, segundo o último relatório da ILGA Europe. Uma das razões para esta subida tem a ver "com a recomendação do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida para que o Governo regule a gestação altruísta, alargando de forma significativa o acesso à família por parte de casais de homens", escreve o Correio da Manhã. No entanto, Daniela Bento, da Associação ILGA Portugal, destaca "que o País tem visto um aumento de 185% de discurso de ódio nas redes sociais e um aumento de ataques e invasões a eventos e locais LGBTI+ por parte de grupos extremistas ultraconservadores”.
A mesma activista salienta que "continua por cumprir a aplicação de medidas específicas da Lei da Autodeterminação nas escolas e a criação de um quadro legal que reconheça o género não binário ou ‘terceiro género".
Embora me auto-classifique como conservador, estou longe de pertencer ou apoiar grupos que ostracizam e cultivam a violência - verbal, que seja - em relação às chamadas pessoas LGBTI+ e à recente moda dos "pronomes", uma moda que acabará mais dia menos dia, dado o seu absurdo. Não me incomoda nada que casais homossexuais possam adoptar crianças. Antes um lar algo "original" - mas feliz - do que a situação de abandono e internamento em instituições, bem como a violência doméstica e o abuso sexual de que muitas crianças sofrem.
Já em relação a uma parte da Lei n.º 38/2018 de 7 de agosto, conhecida como a Lei da Autodeterminação de Género, aplicável nas escolas, tenho sérias reservas. A referida lei determina que "as escolas devem garantir o acesso a casas-de-banho e balneários com base na identidade de género autoatribuída, preservando assim a intimidade, segurança e singularidade das crianças e jovens".
Isto significa que qualquer adolescente masculino, já de pelos na cara, que entenda assumir-se como não-binário ou feminino, pode utilizar livremente as casas de banho onde antes só entravam raparigas. Será bastante incómodo, sem qualquer dúvida, para uma rapariga, ter a seu lado um utente masculino na mesma casa de banho, com a inevitável visibilidade dos órgãos sexuais uns dos outros.
Alternativas para esta ênfase na mistura sexual? Um pouco mais de lucidez e respeito - não pelas pessoas LGBTI+ mas por aqueles e aquelas que não o são e que estão obrigadas a seguir as determinações e princípios impostos - e discutíveis, na minha opinião - por uma minoria de activistas, bastante vocais.
Interrogo-me se os autores da lei - e todos os que a aprovaram - teriam consciência de quão embaraçoso será, para uma jovem rapariga de 12 anos, ter que partilhar as mesmas instalações sanitárias com um rapaz trans, já bem entrado na adolescência e que decidiu que a sua verdadeira natureza sexual era ser mulher. Talvez a solução passe por construir três tipos de casas de banho nas escolas: rapazes, raparigas e outros. Assim, mantinha-se uma divisão que considero natural - nunca soube de um homem que engravidasse - enquanto a fauna de crianças e adolescentes sexualmente confusos frequentava, ao molhe, a terceira casa de banho. E não era preciso instalar urinóis nas casas de banho das raparigas...

O "menino-bonito" da extrema-direita francesa


PAULO REIS

Tem mais de um milhão de seguidores no TikTok, de acordo com a "euronews", e "deu uma lufada de ar fresco à política", refere um dos jovens entrevistados pela agência noticiosa, à porta de um comício do Reagrupamento Nacional (RN), antigamente liderado por Marine Le Pen.
Jordan Bardella, o terceiro político francês mais seguido na plataforma social, tem ascendentes italianos e argelinos, é filho e neto de imigrantes e lidera agora o partido francês mais bem colocado nas sondagens para as próximas eleições europeias: 33 por cento, contra os míseros 16 por cento do partido do presidente Macron.
A sua ascensão no partido, onde se filiou aos 16 anos, passou por um processo de "suavização" dos princípios políticos da geração Le Pen.
Num fenómeno que é transversal à Europa, o discurso anti-emigração continua a ser um dos pontos fortes dos programas eleitorais da direita. O centro-direita tem tentado, com escasso sucesso, "roubar" esse cavalo de batalha à extrema-direita.

O exemplo nacional

Em Portugal, ainda recentemente se assistiu a uma "manobra" dessas, quando da apresentação do livro de conteúdo conservador, "Identidade e Família". De uma forma totalmente inesperada, o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho assumiu um posicionamento típico da extrema-direita, ao associar o excesso de imigrantes ao aumento da criminalidade.   
Discursando antes da apresentação do livro, Passos Coelho fez questão de reavivar uma outra intervenção sua, em 2016, no Algarve, durante uma “Festa do Pontal” do PSD, lembrando que, já nessa altura, tinha alertado para os riscos da imigração, ao afirmar que era necessário sermos "um país aberto à imigração", mas acrescentando: “Cuidado que precisamos também de ter um país seguro“.
Um dos alvos que a extrema-direita aponta como fundamental, para as próximas eleições, é conseguir uma "minoria de bloqueio" (135 eurodeputados) que lhe permita impedir a aprovação de legislação como o Pacto de Migração europeu, salienta o canal noticioso euronews.

A "estrela" da política

Jordan Bardella atrai sobretudo os eleitores mais jovens, de acordo com a maioria das sondagens. Jovem, bem parecido, é uma espécie de versão mais nova de Marcelo Rebelo de Sousa - é um político que também nunca recusa uma "selfie".
A sua biografia também contribui para o seu sucesso político. Cresceu num bairro de habitação social, multiétnico, e é retratado, como salienta o jornal britânico "Guardian", como um "bom imigrante", alguém que "abraçou a cultura e civilização francesas".
Para além de cultivar o princípio de "A França para os Franceses", Jordan Bardella não se exime a criticar violentamente os muçulmanos, que considera serem uma "quinta coluna" que tem como objetivo conquistar o poder e impor os seus princípios a toda a população, destaca o jornal ritânico "Guardian".
A longo prazo, há quem coloque a possibilidade de Bardella ir mais longe e ser o candidato da extrema-direita às eleições presidenciais - isto caso Marine Le Pen se veja numa situação complicada, devido a uma investigação em curso, relacionada com um alegado desvio de fundos europeus.
O sucesso de Bardella assusta a esquerda, ao ponto de o acusarem de querer criar uma "Europa de arame farpado", como disse ao "Guardian" Pierre Jouvet, socialista e também candidato às europeias. Para este político de esquerda, a linguagem de Jordan Bardella é apenas uma espécie de "upgrade" do velho discurso anti-imigrante e xenófobo da família Le Pen: "Está sempre implícito que o responsável dos problemas dos franceses, o 'inimigo', é um estrangeiro, um norte-africano ou um muçulmano.
A grande diferença, argumenta Pierre Jouvet, é o facto de que a mensagem é a mesma mas difundida "com um tom de voz mais suave, equilibrado e calmo."

 

 

What's something that sucks about being white?

 

OLZHAS YESSENBAYEV (OPINION) - PUBLISHED in "Quora"

Quick disclaimer here: I am not White. I am not European. I am Asian, and I come from such a part of the world where History lessons are not tied up with Identity Politics and the concept of “White Guilt”. So perhaps you will be a bit shocked. If you are white, everyone will accuse you of racism, oppression, cultural appropriation, sexism, homophobia, Islamophobia - every sin in the world, even though you by all standards are better than 95 percent of the world. What’s about slavery?

Did you know that slavery existed throughout the entire history of human beings? Europeans were also held as slaves - not only in Ancient Rome but also quite recently - by historical standards - as part of the Arab, Barbary, and Ottoman slave trades. In Constantinople (present-day Istanbul), the administrative and political center of the Ottoman Empire, about a fifth of the population consisted of slaves in 1609 - many of whom came from Caucasus, Eastern Europe, and Africa.

And yet there is no “Turkish” guilt whatsoever. There is no “Arab” guilt. No one in the Arab or Turkish world has a “White Pride Parade” today, nor are Arabs forced by their educational system to cast aside their glorious history and deride their ancestors for slavery.

You can read the same about Slavery in Muslim Spain, in Iran, and so on. Slavery was ubiquitous until it was ended in the 20th century. By Europeans. What about “colonialism”? Did you know that it also existed pretty much everywhere in the world? Here, you can see, that almost a third of the European continent was once a place conquered by the Islamic states, let alone the Islamic conquest of North Africa. Why does no one speak of Islamic colonialism and Islamic guilt?

Colonialism was ubiquitous until it was ended in the 20th century. By Europeans. Life was a mess before the 20th century - pretty much everywhere in the world. The whole concept of human rights, that we today take for granted, did not at all exist until it was established by Europeans. I am by no means claiming that Europeans are - or were - holy.

It is just that everything bad that is ascribed to Europeans - colonialism, racism, slavery, sexism - was ubiquitous everywhere in the world, until it was ended by Europeans. It is just that Europeans were more successful at doing these things.

So please, stop hating your (European) history and take pride in it - just as everyone else in the world does. Every history of every race and ethnicity has its bright and its dark moments. Let’s forget what is long gone and look forward to a world where no such things will exist - only beautiful moments!

domingo, 26 de maio de 2024

Os cinco minutos mais longos da minha vida

  

O PASSAR DO TEMPO (CRÓNICA) - PAULO REIS

Durante uma reportagem na Guiné-Bissau (África Ocidental), um país devastado por uma violenta guerra civil, tive os cinco minutos mais longos da minha vida, por volta das 17 horas de um dia quente, numa “picada” poeirenta, que atravessava a “terra de ninguém”, entre o posto fronteiriço do Senegal e a localidade de Pirada, já em território da Guiné-Bissau.

Estava de pé, a meio da estrada, braços levantados e mãos cruzadas na parte de trás do pescoço, sentindo o cano de uma metralhadora encostada à nuca. Dei por mim a rezar em silêncio (”Pai nosso que estais no céu...”), lágrimas nos olhos, não por causa da dor de ter outros soldados senegaleses à minha frente, espancando-me com as coronhas das armas, mas porque pensava que o meu filho de 3 anos de idade nunca mais veria o pai.

Na altura, tinha deixado Macau, onde vivera os últimos 11 anos. Comecei a trabalhar no diário “A Capital”. Em 7 de junho de 1998, Ansumane Mané, Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas da Guiné-Bissau, foi demitido por suposto contrabando de armas para rebeldes separatistas da região de Casamance no Senegal. No dia seguinte, iniciou uma rebelião militar contra o Presidente, Nino Vieira e foi o princípio de uma sangrenta guerra civil, com algo muito tradicional entre os povos daquele país: cortar a cabeça de inimigos mortos e mantê-los em casa, em um lugar especial, geralmente numa prateleira na sala de estar, como um troféu de guerra

Em 7 de maio de 1999, Nina Vieira foi deposto e Ansumane Mané tornou-se o homem forte da Guiné-Bissau. Duas semanas após o início da rebelião, convenci a editora de “A Capital”, Helena Sanches Osório, a mandar-me para lá.

O ex-presidente da Guiné-Bissau estava na capital, protegido por algumas centenas de soldados leais, com o apoio de um batalhão de pára-quedistas senegaleses. Apanhei o avião em Lisboa e desembarquei em Dakar, a capital do Senegal. Levava comigo uma série de contactos de guineenses, amigos de amigos meus, de Lisboa, e que me poderiam ajudar. Fiquei uns dias em casa de um desses amigos, num bairro fascinante. Os conhecidos e amigos do meu amigo falavam comigo não em crioulo, mas em português. Era um bairro onde se concentravam imigrantes guineenses e onde se viam camisolas do Benfica, Porto e Sporting, penduradas em lugar de destaque, nas cantinas, bares e mercearias. Ao fim de semana, juntavam-se em grupos, nas esplanadas improvisadas, com uma cerveja fresca na mão e o transístor sintonizado nas transmissões da rádio portuguesa. Sabiam ao que é que eu vinha e ajudaram-me imenso.

O primeiro passo daquela autêntica aventura começou às 4 da manhã, num terminal com centenas de carros, nos arredores de Dakar, ainda era noite cerrada. Naquele local concentravam-se as viaturas de transporte informal, a maioria modelos de carrinha Peugeot, completamente lapidadas. Os condutores apregoavam o seu destino e os clientes escolhiam o carro com esse destino. O meu amigo Embaló percorreu as ruas estreitas, aparentemente sem destino, mas acabou por encontrar o que procurava: um condutor amigo, que estacionava sempre no mesmo sítio, e em quem ele tinha confiança para me levar ao meu destino – a fronteira de Pirada, a 600 quilómetros de Dakar.

Esperámos cerca de meia-hora até a lotação do carro estar concluída. Lembro-me que era uma carrinha Peugeot 505, de certeza com mais de 20 anos. Quando tirei o maço de tabaco do bolso, para fumar um cigarro, o condutor chamou-me logo à atenção, dizendo que era proibido fumar por questões de segurança – algo perfeitamente cómico, quando se vai dentro de um carro a cair de podre.

Mas, como sempre, ali funcionava o desenrasque tipicamente africano. Mais ou menos de hora a hora, tínhamos de parar, para o condutor encher o radiador com água dos jerricans que transportava na bagageira do carro.

Era um reabastecimento que eu aproveitava para fumar um cigarro. Parámos numa vilória, por volta da hora do almoço. A refeição era simples: latas de sardinha marroquinas com as mais perfeitas “baguetes”francesas”. Apercebi-me depois de que todo o pão fabricado no Senegal era um resquício da dominação colonial.

A meio do caminho, encontrámos uma outra especificidade africana: uma zona onde a estrada estava cheia de buracos, tapados com terra vermelha. Um grupo de miúdos, a maioria adolescentes, bloqueava a estrada. Descobri depois que era um “negócio” comum: os jovens tapavam os buracos, com terra e depois exigiam um pagamento aos carros que ali circulavam. Se não houvesse pagamento, o carro era corrido à pedrada. Feitas as contas, lá seguimos caminho, com um calor inenarrável.

Chegámos ao destino depois de mais de 12 horas de viagem. A carripana pouco mais dava que 50 quilómetros à hora, com 600 quilómetros de trajecto. Durante toda a viagem, nunca me identifiquei como jornalista, à cautela. Inventei uma história, alegando que tinha família na Guiné-Bissau e estava de férias em Cabo Verde. Preocupados com o destino desses familiares, no meio de uma guerra civil, expliquei que a família em Lisboa me tinha pedido para tentar saber do seu paradeiro.

Acrescentei alguns pormenores verdadeiros – uma boa mentira precisa de alguma realidade factual – e disse aos meus companheiros de viagem que a minha família vivia na cidade de Gabú e eram libaneses. Nesta parte da história, conseguia ser convincente. Uma vizinha da minha mãe era libanesa e estava casada com um português, que tinha feito a tropa na Guiné-Bissau. Expliquei que o marido era meu tio, estabelecendo assim os necessários laços familiares para justificar a viagem. Chegámos a Pirada já de noite e arranjámos lugar para dormir – uma casa com quartos vagos, à laia de pensão, com um colchão de espuma a fazer as vezes de cama. O calor era tão forte que acabei por enrolar a espuma e optar por me deitar no chão de cimento – e calor era algo a que estava habituado, uma vez que nasci em Angola e vivi lá até aos meus 18 anos.

No dia seguinte, já na fronteira, esperámos algumas horas para “tomar o pulso” à situação. A fronteira do lado da Guiné-Bissau estava aberta e as formalidades foram simples. Apanhámos outra carrinha Peugeot para percorrer a meia-dúzia de quilómetros que nos separavam da fronteira senegalesa.

Aí, começaram os problemas. A meio do caminho apanhámos um controle das forças senegalesas. Obviamente que chamei logo a atenção – um branco no meio do nada, a viajar com um grupo de guineenses. Mandaram-me abrir a mochila e viram o computador portátil que levava comigo. A simpatia dos senegaleses, em relação aos portugueses era escassa, porque nos viam como apoiantes do Ansumane Mané.

Semanas antes desta minha viagem, o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, tinha ido a Bissau. Atravessou a linha da frente, para contactar com o líder rebelde. Perante as queixas do Ansume Mané, que lamentou não ter meios de comunicar com ninguém, Jaime Gama entregou-lhe um telefone-satélite que um dos elementos da sua delegação trazia consigo – pormenor que não ajudou nada na antipatia dos senegaleses.

Nessa altura, as coisas começaram complicar-se. O meu portátil era um Toshiba, modelo Satélite. Mal se aperceberam disso, os senegaleses tornaram-se extremamente hostis, acusando-me de ser um espião e de ir levar um telefone-satélite às forças do Ansumane Mané. Todos os meus esforços para lhes explicar que aquilo era um computador foram infrutíferos. Mandaram cruzar as mãos na nuca e começaram a espancar-me, com os cinturões, nas costas. Dois dos soldados que estavam à minha frente usaram as coronhas das armas para me agredir. Tudo isto no meio de uma berraria e ameaças que me davam um tiro.

Entretanto, surgiu um jipe, onde vinha um oficial que, soube depois, era capitão.

Decidiu levar-me para o quartel-general do batalhão ali colocado, em território senegalês, para ser interrogado pelo comandante, um tenente-coronal.

Mantive a história que tinha “construído” e tive uma ajuda do capitão, que sabia distinguir um computador portátil de um telefone-satélite. Como me explicou, já tinha feito parte de um destacamento de manutenção da paz, sem me dizer qual o país.

O espancamento tinha acabado, com a presença do capitão e, minutos depois, fui chamado à presença do tenente-coronel. De novo, repeti a história. Dez minutos depois, mandou-me sair e ficar à espera, numa espécie de palhota, com algumas cadeiras, à porta do quartel. Uma hora depois, apareceu um civil, um homem dos seus 50 anos, que me saudou com um ar amigável. Perguntou o que é que estava ali fazer, sem se identificar. Pela centésima vez, contei a história de estar à procura da família. E dessa vez, fui salvo pelos pormenores verdadeiros que tinha introduzido na história. Quando referi o nome da amiga da minha mãe, ele sorriu e disse-me: “Conheço-a bem, andámos juntos na escola. Ainda a semana passada estive com os pais dela, em Gabú. Diga-lhes que está tudo bem...”

Aliviado, como é natural, acrescentei mais alguns detalhes, dizendo-lhe que a amiga estava bem, especialmente satisfeita porque a filha tinha sido admitida como bailarina no São Carlos – o que também era verdade.

O ambiente ficou mais relaxado e o meu interlocutor revelou que era coronel das forças armadas, estava do lado do Nino Vieira e tinha-se deslocado à fronteira para vir buscar um contingente de reforços senegaleses, para tentar uma incursão a partir da zona de Pirada. Chamou um dos soldados e mandou-o buscar duas cervejas. Confesso que nunca na vida uma cerveja me soube tão bem.

O coronel das forças guineenses deixou a cerveja a meio e entrou no quartel, penso que chamado pelo comandante do batalhão senegalês.

Pouco depois, formou-se uma coluna de cinco jipes e o tenente-coronel mandou-me entrar no veículo onde ele ia. Deixaram-me na fronteira guineense e o coronel virou-se para mim e deu-me um conselho: “Não te quero ver aqui novamente”. Assenti veemente com a cabeça. Não fazia tensões de ali voltar, de facto. Mas acabei por o fazer, numa segunda incursão, até conseguir entrevistar o líder golpista, Ansumane Mané. Mas isso é outra história.

 

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