PAULO REIS
Não obstante as dificuldades em ter acesso a dados concretos, historiadores e especialistas calculam que o esclavagismo ocidental terá atingindo um total de cerca de 20 milhões de africanos. Embora Portugal e Inglaterra tenham desempenhado papéis de relevo, nesse tráfico, não foram os únicos. Escondido pela História, como se nunca tivesse existido, está o tráfico de escravos levado a cabo pelos países islâmicos.
Não só durou muito mais tempo do que os cerca de 400 anos em que as potências ocidentais enviaram escravos para os Estados Unidos e países da América do Sul, como foi muito mais cruel. Durante cerca de 1.400 anos, entre 15 a 20 milhões de africanos foram “exportados” para países islâmicos, de acordo com historiadores e especialistas nesta matéria.
Segundo um artigo de Sean Thomas, da revista The Spectator, o esclavagismo para os países islâmicos começou muito antes de Portugal e outras potências ocidentais terem dado início a esse tráfico.”
O número de africanos traficados são mais ou menos idênticos – à roda de 10 milhões tiveram como destino o continente americano, num negócio controlado pelas potências ocidentais, enquanto entre 15 a 20 milhões foram levados para os países árabes
O esclavagismo islâmico, ainda segundo Sean Thomas, do The Spectator, começou muito antes de as potências ocidentais terem dado início a esse “negócio”. O tráfico de escravos organizado, para os países islâmicos, não só começou muito mais cedo como atingiu valores superiores àqueles dos países ocidentais. E teve a característica muito específica de ser extremamente cruel, quando comparada com as potências ocidentais.
Os escravos africanos eram sistematicamente castrados, para serem utilizados como guardas dos haréns. A prática incidia sobretudo em relação aos cativos mais jovens, por se considerar que tinham mais capacidades de sobreviver. Mas mesmo assim, os historiadores calculam que em cada indivíduo submetido a essa prática, apenas 6 em cada 10 sobreviviam à castração. A prática era proibida pelo Islão, mas os muçulmanos encontraram uma forma de contornar o problema.
Em lugar de serem eles próprios a proceder a essa prática terrível, deixavam a tarefa para os intermediários nas transacções, vendedores de escravos. A castração dos escravos africanos explica um detalhe da componente demográfica dos países islâmicos, quando comparada com escravatura praticada nas colónias do novo mundo. Enquanto os descendentes de escravos africanos, no novo mundo, se reproduziram e constituem hoje uma percentagem razoável de países como os Estados Unidos e o Brasil, a população de origem africana, nos países árabes, é diminuta – facto que se explica pelo hábito da sua castração, impedindo-os de se reproduzirem.
A prática manteve-se durante séculos. Os escravos castrados eram muito mais valiosos do que os eunucos, uma vez que eram utilizados, maioritariamente, como guardas dos haréns.
O tráfico de escravos para os países islâmicos começou 700 anos antes de os países europeus se dedicarem também a esse “negócio”. A manutenção da escravatura nos países árabes prolongou-se muito além de os movimentos abolicionistas ocidentais terem conseguido acabar com esse tráfico – no século XIX, no caso de Portugal. Os estados islâmicos, pelo contrário, mantiveram as suas práticas esclavagistas até ao século XX.
No caso da Arábia Saudita, a escravatura foi proibida apenas em 1962. O Irão e a Jordânia aboliram a escravatura em 1967. Em relação ao Yemen e ao sultanato de Oman, a proibição teve lugar em1970, o Bahrain em 1937, logo seguidos do Kuwait, em 1949 e pelo Quatar em 1952. A Mauritânia tem o primeiro lugar, neste ranking vergonhoso: só em 1981 é que aboliu a escravatura. A escravatura no Irão e na Jordânia foi abolida em 1929. De acordo com o historiador Elikia M'bokolo, num artigo publicado no Le Monde Diplomatic, cerca de 17 milhões de africanos foram traficados para países árabes, O esclavagismo praticado pelas potências ocidentais terá atingido entre 11 a 12 milhões de africanos.
O investigador Olivier Pétré-Grenouilleau coloca como hipótese que cerca de 17 milhões de escravos foram traficados para países árabes, enquanto outro historiador, Ronald Segal adianta um valor de entre 11 a 14 milhões,
Mas qual a razão para as práticas substancialmente diferentes, no esclavagismo ocidental e islâmico? Segundo o historiador Rudolph T Ware III, autor de “Escravatura na África Islâmica”, o hábito da castração dos escravos africanos, praticado naqueles países, para além de “produzir” guardas para os seus haréns e empregados domésticos, tinha como objectivo limitar a sua reprodução, impedindo que casassem com outras africanas. O mesmo autor refere números chocantes, resultantes desta prática: cerca de 90 por cento dos indivíduos castrados não sobreviviam.
No caso do esclavagismo nas
Américas, onde a prática da castração era inexistente, os
proprietários de escravos estimulavam eles próprios a reprodução
de escravos. Era uma estratégia meramente comercial: quanto mais
escravos um fazendeiro tivesse, melhor era a sua situação
financeira, uma vez que cada um deles era utilizado como trabalhador
nos campos de algodão e noutras actividades agrícolas. Cada escravo
era um investimento, por assim dizer. Uma estratégia muito distante
da forma como os países islâmicos encaravam o esclavagismo - uma parte da História mundial que está apagada e náo surge nos livros escolares, por razões politicamente correctas...
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