quinta-feira, 6 de junho de 2024

Estátua de Ferreira do Amaral: um "apagão" de Rocha Vieira na História de Macau


Em 1821, Ferreira do Amaral era aspirante de Marinha e iniciou a sua carreira servindo na esquadra do Brasil. Após a separação do Brasil de Portugal, todas as províncias proclamaram o Império, excepto a Bahia que permaneceu fiel à metrópole, e rendeu-se apenas em Julho de 1823, depois de vários combates entre portugueses e brasileiros.

A 7 de janeiro de 1823, durante a Batalha de Itaparica, distinguiu-se o guarda-marinha Ferreira do Amaral, pela sua bravura em combate: sob as ordens imediatas do capitão-de-fragata Joaquim José da Cunha, então comandante da nau D. João VI, tendo o braço direito despedaçado por uma bala de canhão, no desembarque da praia da ponta do Mocambo, mesmo ferido gravemente continuou a comandar os seus homens na carga, até ser recolhido a bordo do bergantim Prontidão, onde lhe foi amputado o braço.[1] Apesar de mutilado, prosseguiu na sua carreira e foi promovido a tenente.

Em consequência da Primeira Guerra do Ópio, Inglaterra fundou uma colónia na ilha de Hong Kong, que se tornou o porto ocidental mais importante na China. Estes acontecimentos levaram o governo de Portugal, em 1844, a decidir tornar Macau uma verdadeira colónia portuguesa. Em 1845, a cidade foi declarada um porto franco e tornada independente do governo da Índia, ao qual estava sujeita até então.

Macau tinha até então duas alfândegas: a portuguesa, que cobrava impostos sobre o comando dos navios nacionais, constituindo a única renda pública de que se pagava aos funcionários da cidade; e a chinesa (o Ho-pu), cujos impostos eram cobrados pelos mandarins do Império Chinês. O Governador Ferreira do Amaral expulsou os mandarins de Macau, aboliu a alfândega chinesa, pôs fim ao pagamento de vários tributos e impostos (de entre os quais o aluguer de Macau) às autoridades chinesas, abriu os portos, construiu estradas nos campos anteriormente vedados pelos chineses, ocupou oficialmente a ilha da Taipa, lançou tributos e reorganizou os serviços públicos.

O seu governo enérgico, em defesa dos interesses de Portugal e pelo domínio do território, desagradou aos mandarins, que trataram de mandar eliminar tão determinado inimigo. Na tarde do dia 22 de Agosto de 1849, Ferreira do Amaral saiu para o seu habitual passeio a cavalo, acompanhado pelo seu ajudante de ordens Jerónimo Pereira Leite. Passou as Portas do Cerco e foi atacado por um grupo de três chineses que o decapitaram, para levarem a cabeça aos mandarins de Cantão, a fim de receberam a sua recompensa. O ajudante de ordens limitou-se a fugir a sete pés, sem ajudar o governador a defender-se do ataque.

Hoje em dia a estátua, transferida de Macau para Portugal em 1992 está num local discreto, em Lisboa, no jardim da Alameda da Encarnação. Quando da sua retirada, houve críticas da comunidade portuguesa, que considerava que a estátua devia ficar no seu local e a decisão da sua manutenção ou não deveria ser uma decisão do governo chinês depois da transição para a China, em 1999. Até por parte da comunidade chines houve reações, também críticas, quanto à retirada da estátua. Num artigo de opinião do Va kio, segundo maior jornal chinês de Macau, afirmava-se que a estátua devia ficar no seu local, porque se tinha transformado num ícone local, com muitos turistas a tirarem fotografias junto ao seu pedestal.

Mas o governador Rocha Vieira foi bastante mais papista que o Papa, neste caso, e mandou apagar completamente qualquer vestígio da existência da estátua, no Museu da História de Macau, inaugurado no âmbito de uma visita a
Macau do primeiro-ministro António Guterres em
em 1998. Até a escolha de mapas antigos em exbição foi tão criteriosamente feita que em nenhum deles se assinala a existência da estátua - isto porque não estava em exibição nenhum mapa posterior a 24 de Junho de 1940, data da inauguração da estátua.  “Acho que o Museu é importante para a Região Administrativa Especial de Macau, que não é só o que está nos textos oficiais, como um sistema político e um sistema judiciário próprios, mas tem uma história e uma memória” disse então Rocha Vieira, no final de uma audiência com o primeiro-ministro.

Política - História / Paulo Reis ( c/ Wikipedia)

quarta-feira, 5 de junho de 2024

As escutas de Bugalho (II)

Sebastião Bugalho, em declarações à revista Sábado, em Junho de 2023, afirmou que nunca teve "qualquer relação empresarial, partidária, transacional ou negocial com qualquer um dos visados", no processo  de investigação de favores políticos, que envolvia vários deputados do PSD e o então presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina. Na mesma revista são transcritos telefonemas e mensagens por sms entre o deputado Carlos Reis (um dos envolvidos no referido processo) e Sebastião Bugalho, interceptados pela Polícia Judiciária. 

Numa dessas mensagens, por sms, Carlos Reis interroga Sebastião Bugalho sobre se recebeu "a massa". Sebastião Bugalho confirma, em sms: "Sim, confirmado". Carlos Reis envia outra mensagem por sms, a Sebastião Bugalho: "Ótimo. Recibos antigos amigos, n esqueças pf". Seria interessante (e a Gazeta Digital tentou fazê-lo, via email) saber a que tipo de negócios ou transações financeiras esses recibos ("antigos" e "amigos") diriam respeito, uma vez que Sebastião Bugalho garantiu à Sábado que, em relação aos visados na mencionada investigação (deputado Carlos Reis incluído…), nunca teve "qualquer relação empresarial, partidária, transacional ou negocial" com qualquer um deles.

Política / Paulo Reis 

Crime, estrangeiros e imigrantes



O primeiro-ministro afirmou, na passada segunda-feira não haver nenhuma “relação direta entre imigração e o aumento de índices de criminalidade”, na apresentação do novo plano do Governo para as migrações.
“Não há nenhuma relação direta entre imigração e aumento de índices de criminalidade. Não vale a pena estigmatizar essas comunidades à boleia de episódios que são casuísticos. Há, naturalmente, pessoas que cometem crimes, uma são portuguesas e outras são estrangeiras”, disse Luís Montenegro.
 
Segundo os dados dos Censos 2011 (Instituto Nacional de Estatística), à data de 21 de Março em Portugal residiam 394.496 estrangeiros, representando 3,7% do total de residentes do país.

De acordo com um trabalho de investigação publicado na "Revista de Ciências Sociais", da autoria de Maria João Guia e João Pedroso ("Imigração e crime violento: um olhar a partir de reclusos condenados") também de 2011, adianta-se que "os dados nacionais disponibilizados sugerem a existência de uma percentagem inferior de crimes violentos entre os reclusos não nacionais, mas uma taxa de incidência superior. Verifica-se ainda uma sobrerrepresentação de reclusos não nacionais nas prisões (…)."

Como se pode ver no quadro estatístico aqui reproduzido, em 2011 os 3,7 por cento de não-nacionais representavam 20,8 por cento no total de reclusos condenados por "Crimes Contra as Pessoas", nas prisões portuguesas, de acordo com dados obtidos, pelos autores do estudo, junto da ex-DGSP e do Eurostat. Os mesmos dados referentes a cidadãos portugueses eram de 25.6 por cento, também no grupo "Crimes Contra as Pessoas."
 
Emigração - Criminalidade / Paulo Reis 


 

6 de Junho de 1944: o dia em que Hitler começou a perder a guerra

  

A operação de invasão da Europa, para abertura de uma segunda frente e aliviar a pressão nazi sobre as forças soviéticas, foi lançada no dia 6 de junho de 1944, há 80 anos, com o nome de código “Overlord”. Cinco divisões das tropas aliadas desembarcaram nas praias da Normandia, em França. Os códigos das praias de desembarque eram Utah, Omaha, Gold, Juno e Sword.

A batalha, e especialmente os bombardeios aliados de aldeias e cidades francesas, mataram cerca de 20.000 civis franceses. As vítimas alemãs exactas não são conhecidas, mas os historiadores estimam que entre 4.000 e 9.000 homens foram mortos, feridos ou desapareceram durante a invasão do Dia D, de acordo com a mesma fonte.

O número total de vítimas durante a Operação Overlord, de 6 de junho (a data do Dia D) até 30 de agosto (quando as forças alemãs se retiraram para a zona do rio Sena) foi mais de 209.000 vítimas aliadas.

Muito mais de 90% da primeira onda de tropas que desembarcaram nas cinco praias sobreviveu. As perdas, embora fossem grandes, não foram decisivas nem impediram a progressão das forças aliadas. Do total de 34.000 soldados na primeira onda de desembarque de soldados, as vítimas foram cerca de 2.400, bem abaixo de 10%, salienta o texto da Wikipédia.

Um pormenor curioso passou-se com o primeiro-ministro Winston Churchill, que anunciou que iria acompanhar o desembarque, no navio Belfast. A ideia mereceu a oposição de muitos responsáveis militares e o primeiro-ministro só desistiu quando o rei Jorge VI disse que, nesse caso, ele também iria acompanhar o desembarque – o que fez com que Churchill abandonasse a ideia.

O tenente-general Frederick Morgan foi o principal responsável pelo planeamento da Operação "Overlord". Foi nomeado, em 1943, Chefe de Estado-Maior do Comandante Supremo Aliado (COSSAC). Em maio de 1944, os Aliados ocidentais estavam preparados para dar o seu maior golpe da guerra, a invasão do norte da França.

O general Dwight D. Eisenhower foi o comandante supremo da operação que envolveu os esforços coordenados de 12 nações. Roosevelt foi o único general a desembarcar no Dia D, com a primeira onda de tropas, salienta a Wikipedia. Aos 56 anos, foi também o homem mais velho a participar na invasão. O seu único filho, o capitão Quentin Roosevelt II estava entre a primeira onda de soldados desembarcados em Omaha Beach. 

História / Paulo Reis (c/Wikipedia)

 

Juíza processa Mamadou Ba

 

O activista Mamadou Ba vai enfrentar um processo-crime, por tentar ”condicionar” a juíza do Juízo Local Criminal de Lisboa, de acordo com a revista Sábado. A magistrada mandou extrair certidões das alegações finais de Mamadou Ba, num julgamento por difamação, resultante de uma queixa do dirigente de extrema-direita Mário Machado. Mamadou Ba, em declarações à Imprensa, afirmou que Mário Machado era um “assassino” devido ao seu papel num confronto, no Bairro Alto, com um jovem africano, que morreu depois de ter sido espancado por um grupo de skinheads.

No julgamento desse caso, Mário Machado foi absolvido – argumento em que o líder do grupo 1143 baseia a sua queixa por difamação contra Mamadou Ba. O activista africano foi condenado, nesse processo por difamação, ao pagamento de uma indeminização de 2.400 euros ao activista, condenação que, recentemente, o Tribunal da Relação de Lisboa anulou por falta de fundamentação, mandando repetir o julgamento.

Nas suas alegações finais, Mamadou Ba chamou à acusação “uma das maiores borradas do juiz Carlos Alexandre”.Quanto à extracção de certidões, ordenada pela juíza Joana Ferrer, Mamadou Ba considerou tratar-se de uma “clara retaliação” da juíza.

Justiça / Paulo Reis 


 

terça-feira, 4 de junho de 2024

Um estranho "passeio"

 

"(...) Conheci o T. numa noite de copos, no Bairro Alto. Era polícia à paisana, dedicado essencialmente ao combate ao tráfico de droga. Na mesa estava também um colega jornalista, que trabalhava na área do crime. Fiz-lhe algumas perguntas, curioso sobre o tema e trocámos telefones, para outra noite de copos.

Liguei-lhe uma semana antes de ir fazer um passeio pela rua do Bemformoso, para “cheirar” o que lá passava – e que seria interessante, pelas notícias e reportagens que ia lendo e vendo em diversos órgãos de Comunicação Social.

Pedi-lhe um retrato de como é que funcionavam as coisas, por ali. E era simples: indianos e paquistaneses dedicados ao tráfico demão-de-obra e guineenses a controlar a venda de droga – essencialmente “crack”, o parente pobre da heroína. Barato – uma “pedra”, mais conhecida por “pipoca”, para consumo de uma pessoa, custa apenas 5 euros. Tem um efeito rápido, é extremamente viciante, mas o tempo de "pedrada" é curto.

Na rua do Benformoso, depois do jantar, dei um passeio pela rua, de ponta a ponta. Nos passeios, centenas de indianos e paquistaneses, em grupos de três, quatro, estavam entretidos em longas conversas, puxando do telemóvel com frequência. Já durante a tarde tinha reparado nessa curiosidade mas, à noite, estavam cinco vezes mais pessoas, nos passeios. Ficavam ali horas seguidas, sempre um pequenos grupos. Não entravam nas lojas nem nos restaurantes, apenas ocupavam completamente os passeios, obrigando os transeuntes a deslocarem-se pela rua. 

Já noite dentro, pela hora de jantar, circulavam outras largas dezenas de imigrantes, para cima e para baixo, a maioria com mochilas – sinal talvez de que, provavelmente vinham do trabalho para “casa”. Tal como o meu amigo polícia me tinha explicado, o trabalho desses pequenos grupos teria a ver com sistemas de contratação de mão-de-obra, através de documentos falsos e outras manobras, como a subcontratação para trabalhadores na agricultura, na zona do Alentejo. Só assim se justificava que tanta gente estivesse por ali, nos passeios, às quatro, cinco da tarde, quando é suposto ser uma hora em que se está a trabalhar, disse para mim próprio. (...)

Reportagem / Paulo Reis

1989, dia 4 de Junho: 35 anos depois e uma imagem que ficará para sempre

 


“Eu roubo, mas faço!”

É notável, para quem folheia todos os dias o Correio da Manhã, a quantidade e regularidade com que surgem notícias sobre casos de corrupção envolvendo autarcas e empresas, todas do mesmo concelho. Muitas vezes são amigos de longa data ou já estiveram dentro e fora da política, praticando a tal técnica de “portas giratórias”. Normalmente, são dinheiros públicos, provenientes das câmaras e que, em manobras mais ou menos discretas, acabam por ir parar ao cofre das empresas. A “transferência” destes dinheiros é feita, regra geral, através de concursos públicos talhados à medida da empresa A ou da empresa B.

Os “bons” autarcas, os que são useiros e vezeiros nestas práticas, têm sempre o cuidado de deixar alguns euros para empresas que não fazem parte do sistema, para que não haja protestos suficiente sonoros num jornal lá da terra ou queixas judiciais.

Esses, não comem tudo e até deixam alguma coisa para os outros – uma prática de elogiar, porque revela que a ganância tem limites, para quem é mais inteligente ou hábil. Graças a este tipo de compadrios, a língua portuguesa foi enriquecida, já lá vão muito anos, com um novo verbo: “Isaltinar”. Neste episódio, funcionaram mal duas coisas: uma excessiva ganância e alguém que se abespinhou, por razões que ignoro. Mas o autarca em causa, cumprida a pena, saiu da cadeia, triunfante e sem mostrar o mínimo sentimento de culpa. Fez-me lembrar, na altura, uma animada campanha eleitoral no Brasil, onde um candidato sincero tinha um slogan delicioso: “Eu roubo mas faço!” Infelizmente, em Portugal, há a tendência de quase todos os autarcas se assumirem como virgens pudicas, jurando e trejurando, nas campanhas eleitorais, que só irão trabalhar para o povo e desenvolver a terrinha, com mais algumas rotundas, centros culturais e pavilhões gimnodesportivos.

Mas se hoje em dia a situação não é grande coisa, no que diz respeito a autarcas e negócios, apenas com 308 concelhos, imagine-se como seria quando Portugal, há 180 anos, tinha um número de municípios que rondava os 800, como refere o professor António Cândido de Oliveira, num artigo de opinião publicado no JN, em 2016. Teria que se arranjar um novo vocábulo, tipo “Isaltininho”, para classificar alguns desses autarcas e respectivos concelhos, de reduzida dimensão. 

Felizmente que a reforma territorial dos concelhos, subscrita por Manuel da Silva Passos, reduziu o número de concelhos a 351 – número que se mantém quase intocável, hoje, com 308 concelhos. Terá que se agradecer a Manuel da Silva Passos a hercúlea tarefa de reduzir para menos de metade as autarquias existentes em Portugal. E agradecer a Deus que estejamos longe de países como a Espanha (cerca de 8 mil municípios) a Itália (também à roda dos 8 mil) e o campeão deles todos, a França, com 36 mil municípios. Se não fosse a gigantesca talhada dada por Manuel da Silva Passos (e não por Mouzinho da Silveira, como se costuma referir), lá teríamos que inventar mais uma palavra para o léxico português: Além dos “Isaltininhos”, que se "alimentavam" em  minúsculos concelhos, os “Isaltinhões”, que medravam em concelhos de maior dimensão.

Opinião - O Passar do Tempo / João Tavira


 

Fraudes no reagrupamento familiar de imigrantes vão continuar

  Uma simulação de um pedido de reagrupamento familiar, numa família composta por residente em Portugal, mulher e filho menor, alvo do pedid...