sábado, 19 de abril de 2025

O movimento islâmico Tabligh Jamaat: um factor de ruptura na integração dos muçulmanos em Portugal

 

 

O Grupo extremista Tabligh Jamaat "representa, por um lado, e incontestavelmente, a força de maior dinamização do Islão entre os muçulmanos em Portugal. Por outro, o seu rigoroso tradicionalismo, traduzido na prescrição do próprio vestuário, na estrita separação entre os sexos, numa atitude de distanciamento em relação à sociedade exterior, representa, como já referi, um factor de ruptura na tendência histórica para a integração na atitude dos muçulmanos em Portugal", afirma Abdool Karim Vakil (filho do ex-presidente da Comunidade Islâmica de Lisboa e investigador do prestigiado King'College em Londres) numa investigação intitulada “Do Outro ao Diverso – Islão e Muçulmanos em Portugal: história, discursos, identidades”

Os Tabligh Jamaat foram, recentemente, banidos da Arábia Saudita, que classificou o grupo como sendo "uma 'porta' para o terrorismo." Os Tabligh Jamaat são os responsáveis pela organização anual do maior encontro de muçulmanos, depois da peregrinação a Meca. Cerca de quatro milhões de elementos reúnem-se na cidade paquistanesa de Raiwind, havendo encontros semelhantes e de dimensão idêntica no Bangladesh e na Índia.

Os Tablighi Jamaat, que significa "o partido dos pregadores do Islão" foi fundado em 1926 pelo clérigo indiano Muhammad Ilyas al-Kandhlawi com o objetivo de espalhar o Islão para os não-muçulmanos e também para purgar a fé das influências de outras religiões, mais notavelmente as influências hindu e cristã na Índia Britânica na época.

A organização é um remanescente do movimento Deobandi do Islão, que surgiu na cidade indiana de Deoband, como resposta à suposta deterioração dos valores islâmicos na Índia. Antes um movimento local, os Tablighi Jamaat espalharam-se por diversos países. O grupo também organiza reuniões anuais semelhantes à que tem lugar na cidade de Raiwind,  na Índia e também no Bangladesh. Media locais consideram que o encontro de Bangladesh tem a mesma dimensão do organizado no Paquistão.

O movimento islâmico Tabligh Jamaat também reúne anualmente na Mesquita de Lisboa, num encontro internacional que decorre num ambiente aparentemente calma e descontraído, de acordo com Lusa. No entanto, num recente encontro, os membros do movimento recusaram falar à Comunicação Social, alegando que apenas que Esmael Loonat (um dos líderes do Tabligh Jamaat em Portugal) podia falar. Para além de Esmael Loonat, vários responsáveis da Comunidade Islâmica do Sul do Tejo e da Escola Islâmica de Palmela são membros do movimento.

De acordo com Esmael Loonat, em declarações ao jornal Público afirmou que, da parte dos Tabligh Jamaat "não existe rejeição dos valores ocidentais (…) os pregadores do Tabligh também não têm como objectivo a conversão dos não-muçulmanos (…) Só desenvolvemos a nossa actividade junto dos muçulmanos", acrescentou.

Estas declarações, no entanto, são completamente contraditórias em relação à análise feita por Abool Karim Vakil, que salienta, no estudo acima referido, que os Tabligh Jamaat "representam, por um lado, e incontestavelmente, a força de maior dinamização do Islão entre os muçulmanos em Portugal." Abool Karim Vakil destaca, " (…) por outro, o seu rigoroso tradicionalismo, traduzido na prescrição do próprio vestuário, na estrita separação entre os sexos, numa atitude de distanciamento em relação à sociedade exterior, representa, como já referi, um factor de ruptura na tendência histórica para a integração na atitude dos muçulmanos em Portugal"

A rejeição dos valores ocidentais, por parte dos Tabligh Jamaat, é revelada de forma clara num artigo publicado em 2001, na revista islâmica Al-Madinah, editada pela Comunidade Islâmica do Sul do Tejo. De acordo com esse artigo da revista Al-Madinah, "nas escolas comuns (...) torna-se impossível salvaguardar a fé. A solução disto passa pela criação de instituições islâmicas, onde as crianças possam crescer num ambiente islâmico" - sendo a Escola Islâmica de Palmela um exemplo dessa estratégia.

Em 2004 os Tabligh Jamaat editaram uma tradução portuguesa daquilo que é a sua "bíblia", um livro  intitulado "Fazail-E-Amaal", “As virtudes das acções”, que esteve à venda na Mesquita de Lisboa apenas durante algumas horas. A publicação no semanário O Independente, de duas páginas sobre o movimento em Portugal e o conteúdo de "As Virtudes das Acções" (da minha autoria) atraiu a atenção de outros Órgãos de Comunicação Social e quando chegou à Mesquita de Lisboa uma carrinha da televisão, os elementos do grupo retiraram a publicação, rapidamente, dos escaparates.

No entanto, o próprio imã da Mesquita, David Munir, aconselhou a sua leitura durante a habitual oração de sexta-feira. O último capítulo do livro "As Virtudes das Acções" que tem como título: “A Degradação Muçulmana e a sua Única Solução” apela a um “forte contra-ataque”, no intuito de recuperar o domínio do Islão sobre o mundo, dentro dos limites e das directrizes da “Shariah”, de acordo com o blogue "O Carvalhadas".

O livro propõe ainda que, para atingir esses objectivos, sejam adoptados os “métodos e os meios demonstrados pelo Santíssimo Profeta de Alá, isto porque o profeta não só foi bem sucedido no seu objectivo, como foi capaz de eliminar todas as relações (religiosas) entre os seus seguidores e elementos de fora”, acrescenta "As Virtudes das Acções". Actualmente, há pelo menos seis comunidades islâmicas que estão a preparar a abertura de outras tantas escolas islâmicas, idênticas à Escola Islâmica de Palmela.

Para além disso, existem várias "madrassas" (escolas religiosas islâmicas) espalhadas pelo país - por exemplo, em Odivelas, onde funciona uma escola de apreciável dimensão. A acrescentar a isto, há o facto de, na maioria das comunidades muçulmanas existentes em Portugal funcionarem "tribunais islâmicos", onde os casos são julgados de acordo com a "Sharia", a lei islâmica. Um desses tribunais funciona, há mais de uma dezena de anos, na Mesquita de Lisboa e é presidido pelo xeque David Munir.

Para além da Mesquita de Lisboa há cerca de 50 mesquitas e locais de culto islâmicos, espalhados pelo país (incluindo até os Açores). Embora não haja números oficiais, calcula-se que existam cerca de 60 mil muçulmanos em Portugal, Há uma clara divisão, em termos de práticas religiosas e culturais, entre os muçulmanos provenientes da Guiné-Bissau - uma emigração mais antiga e bem integrada na sociedade portuguesa - e os muçulmanos provenientes do Paquistão, Bangladesh e Índia que, actualmente, são a maioria da comunidade islâmica.


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