Nova (?) droga em Portugal
O Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária identificou, pela primeira vez em Portugal, uma nova substância psicoativa – ARECOLINA – detetada em tabaco de mascar, misturada com nicotina e mentol, refere uma nota da PJ.
A substancia foi detectada em tabaco aprendido, na sequência do desmantelamento, pela equipa de investigação de crimes e contraordenações do destacamento da Ação Fiscal da GNR, de uma unidade clandestina de produção e embalamento em larga escala de tabaco de mascar, nos concelhos de Lisboa e de Sintra.
Nos termos regulamentados, a deteção laboratorial foi já transmitida aos organismos internacionais competentes, através do ponto focal nacional. A ARECOLINA é um alcaloide encontrado na noz de areca, fruto da palmeira areca. Tradicionalmente, em algumas culturas asiáticas, este fruto é mascado para obtenção de efeitos estimulantes.
A PJ não precisava de ter tanto trabalho. Bastava ir à rua do Bemformoso, onde dezenas de vendedores, com umas pequenas mesas de dobrar, vendem "paan", uma espécie de tabaco de mascar, composto basicamente por ARECOLINA, um alcalóide da noz de aroca, tabaco e mentol, enrolados em folhas de bétel. O rolo é introduzido na boca, entre a gengiva e o interior da bochecha. O conjunto tem um efeito psicotrópico, provocando uma sensação de leveza, bem-estar e estimulante. Os consumidores de "paan" são detectados com facilidade: o consumo regular de "paan" faz com que os dentes e gengivas fiquem com uma coloração vermelha. O cancro na boca é uma das consequências mais comuns nos consumidores de "paan".
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Os mastigadores de “paan”
Da intensa experiência que foi viajar nos estados do Nordeste da Índia, uma coisa houve que ficou marcada vivamente na memória dos sentidos: o paan… o cheiro, a côr, os gestos, o som do cuspir e o rasto vermelho deixado pelo chão.
Mas o que é o paan!?! Basicamente paan é noz de areca (areca nut), cujo aspecto se assemelha à noz-moscada, cortada em pequenos pedaços, e envolvida em folha de bétel, uma trepadeira de folha verde que tem efeitos estimulantes. A esta mistura junta-se muitas vezes tabaco (de mascar) e cal (hidróxido de cálcio)… sim, a mesma cal como a que se usa para revestir paredes.
A noz de areca, assemelha-se muito à noz-moscada, tanto no tamanho como no aspecto do fruto, mas em vez de nascer de uma árvore é o fruto de uma palmeira, cujas nozes crescem em cachos no topo de um fino e alto tronco.
A folha de bétel é cuidadosamente dobrada em forma de um pequeno rectângulo, conservado a noz de areca, e colocada na boca, sendo ligeiramente mastigada de forma a libertar lentamente os sucos, que aos poucos vão dando uma coloração avermelhada à saliva, que se estende aos cantos da boca e aos lábios. Ao fim de alguns anos de utilização, resulta não só os dentes deteriorados e manchados de vermelho, como também uma certa adição, devido às propriedade da folha de bétel. Misturada com tabaco, aumentam ainda mais os efeitos cancerígenos da noz de areca.
O paan produz uma forte salivação, o que faz com que os seus consumidores tenham necessidade frequente de cuspir, o que é muitas das vezes feito de forma aparatosa, num jacto de saliva avermelhada, que deixa um rasto pelas ruas, passeios e até paredes!
Sendo bastante popular na Índia, o hábito de consumir paan encontra-se espalhado um pouco por todos os países asiáticos, como o India, Nepal, Bangladesh, Sri Lanka e Birmânia, sendo este ultimo o país onde a presença de paan é uma constante, desde mulheres a crianças.
Mas a passagem por alguns dos estados do Nordeste da Índia, Assam, Nagaland e Meghalaya deixou uma marca mais forte deste fenómeno. Aqui, talvez mais do que em qualquer outra das regiões da Índia a noz de areca é “rainha”, sendo mesmo mastigada sem a folha de bétel ou outros ingredientes.
Sendo predominantemente um hábito masculino, comum entre a população mais pobre, é uma imagem de marca entre motoristas de autocarros e condutores de tuk-tuks; mas no Nordeste da Índia o paan é também bastante popular entre as mulheres, sendo o seu consumo transversal às várias camadas sociais, não sendo de estranhar encontrar um pastor na ilha de Majuli a cuspir o paan ou a recepcionista de um hotel em Mokokchung com os cantos da boca marcados pelo vermelho da noz de areca.
O consumo de tabaco de mascar é também bastante popular, sendo misturado com cal, de forma a humedecer as folhas formando uma pasta que se coloca junto à gengiva. A preparação do tabaco, esfregando a mistura na palma da mão com os dedos, que depois é ligeiramente batida para ficar espalmada, são um dos gestos que se vêm constantemente… nas cidades ou nas vilas, nas ruas ou nas lojas, em autocarros e comboios…
Apesar do acto de mascar tabaco ser desagradável, pois produz também a necessidade frequente de cuspir, o paan, com o seu cheiro adocicado criou ao fim de três semanas de viagem pelo Nordeste da Índia, uma certa repugnância pela combinação do som com o jacto de saliva vermelha libertado pelos mastigadores de paan, que não se esforçam por ser discretos ou delicados, fazendo do acto de cuspir uma arte, onde por certo a trajetória e distância do rasto vermelho deixado no chão é motivo de orgulho.
E um pouco por todo o lado, vêm-se sempre marcas brancas deixadas pela cal que colada aos dedos, é que depois são esfregando em ombreiras das portas, junto à lojas de paan, ou nos bancos dos autocarros e comboios…
O cheiro deixou também uma forte marca na minha memória, com quartos de hotel a cheirarem a paan, e com viagens longas de autocarro ou the sumo, a serem feitas na companhia de activos mastigadores de paan, cujo cheiro adocicado impregna o espaço, e a cruzam regularmente o meu campo de visão para cuspirem pela janela.
Uma negativa mas forte memória que criou em mim uma repugnância ao paan, ao qual os meus sentidos não conseguem ficar indiferentes.
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